Trabalho com registro de marcas há quase 15 anos (desde 1997) e nesse tempo todo tenho acompanhado as mais diferentes situações e comportamentos, mas me chama especial atenção um personagem nesta história: o designer.
Quando um advogado, engenheiro, médico ou arquiteto é contratado para um trabalho, ele tem muito mais do que a responsabilidade de cumprir prazos e executar a tarefa que lhe foi conferida, tem responsabilidade jurídica sobre seus atos.
O designer é igualmente responsável pelo seu trabalho, apesar das aparências.
Geralmente, a impressão que temos (todos, inclusive clientes e designers) é que quanto um designer (ou estúdio) é contratado para criar uma marca para determinado produto ou serviço, sua responsabilidade se resume a criar algo que o cliente goste, que lhe transmita satisfação e que, em sua opinião, reflita as qualidades que ele quer ver reconhecidas no seu produto, certo?
Agora pergunto: e se a marca criada, é: Linda! Incrível! Maravilhosa! Mas é impossível de ser registrada? Ou, pior, já esteja registrada por outra empresa para o mesmo tipo de produto? Qual é a responsabilidade do designer neste caso?
Na verdade tudo depende do início da história, aquela introdução básica que sempre “pulamos” para ler diretamente o capítulo onde o mocinho pega o bandido, esquecemos de fazer um contrato ou, pelo menos, formalizar de alguma forma O QUÊ o cliente está “comprando”.
Quando o cliente traz um nome pré-definido por ele e pede para que o Desginer (ou agência de publicidade) crie uma identidade visual para esse “nome” a responsabilidade dele se resume aos aspectos visuais, essa nova marca não deve colidir visualmente com outras já existentes a ponto de causar confusão ao consumidor (ou seja, não pode ser uma “chupada”).
Já quando o cliente traz somente um briefing do produto e contrata o designer (ou agência) para criar um nome (naming) e desenvolver a identidade visual deste nome, sua responsabilidade sobre o mesmo é de 100%.
É por esse motivo que quando uma empresa ou site oferece fazer naming baratinho e ainda diz que vai dar 30, 60, 200 opções de nome eu perco totalmente o respeito por essa empresa. A cada ano são feitos mais de 100.000 novos pedidos de registro de marcas, então você acha possível comprar um “pacote” de nomes válidos por 300 “merrecas”‘?
Cabe à agência criar um nome viável de registro e que não cause mais problemas ao cliente do que soluções, salvo a possibilidade do próprio cliente determinar que deseja essa semelhança, mas não se esqueçam de documentar isso, senão fica o dito pelo não dito e você responderá SOLIDARIAMENTE em caso de pirataria.
Isso mesmo, a palavra maldita PI-RA-TA-RIA. Quando a agência cria uma marca colidente com outra já registrada ela está colaborando com a pirataria, com o uso indevido de marca de terceiro, em resumo: CRIME PREVISTO EM LEI.
Para evitar essa “saia justa” você deve tomar alguns cuidados simples:
Documente a relação com seu cliente, deixe claro o que ele está comprando. Mesmo que não haja um contrato formal, algum tipo de documento deve haver, uma autorização de serviços, pelo menos um e-mail, etc.;
Caso o cliente deseje explicitamente imitar um concorrente, documente essa intenção ou você estará sujeito a grandes complicações. Caso o cliente se negue a documentar essa situação, melhor perder o cliente do que perder a agência (veja, mais abaixo, os riscos); e
Fique atento, não se deixe levar pela “conversa” do cliente ou pela confiança excessiva.
Quando uma marca viola outra já registrada os principais riscos são:
Processo por USO INDEVIDO DE MARCA DE TERCEIRO – Com previsão de multa/indenização que geralmente varia entre 3% e 5% do faturamento com o produto nos últimos 5 anos e prisão de 3 meses a 1 ano.
Indenização por CRIME DE CONCORRÊNCIA DESLEAL e DESVIO DE CLIENTELA – não há regras fixas quanto à indenização nestes casos, mas geralmente o autor da ação apresenta ao juiz estimativas das suas perdas (vendas que deixaram de ocorrer em função da pirataria).
Processo requerendo indenização por LUCRO CESSANTE – muito comum quando a pirataria envolve um domínio na internet. Atualmente os tribunais já têm considerado a internet como um ponto de venda, então, se uma empresa registra como domínio a marca de outra impedindo-a de usa-la, pode sofrer esse tipo de processo.
DANO MORAL E MATERIAL – menos comum, mas há risco de que a empresa lesada solicite indenização pelo dano causado a sua imagem durante o período em que houve a pirataria.
Concluindo toda essa história: em tempos que se fala de profissionalização, regulamentação, enfim, não vamos esquecer do básico: a função da marca é ser única no segmento que atua e, ao bom designer, cabe essa honrosa e difícil missão.
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